Tereza Alux tem quase 20 anos de experiência em UX, trabalhando de forma colaborativa e co-criativa na criação de produtos e serviços de acordo com as necessidades das pessoas. Já teve passagem por empresas do setor financeiro, publicitário, saúde e entretenimento. Hoje é Designer de Produto no Mercado Livre, professora de Design Digital no MBA de UX Strategy da FIAP e Diretora Global da comunidade Ladies That UX, uma organização global que tem como objetivo melhorar a participação feminina na área de UX e tecnologia.
Toni Morrison, autora e referência para o título desse artigo (no original “You wanna fly, you got to give up the shit that weighs you down.” em Song of Solomon) é uma escritora e professora estadunidense, negra, nascida em 1931. Ela recebeu o Nobel de Literatura em 1993 e o Prêmio Pulitzer de melhor ficção em 1997. Suas obras relatam as experiências de mulheres negras nos Estados Unidos durante os séculos XIX e XX, além disso, produziu diversas peças, ensaios, obras de literatura infantil e um libreto de ópera. Sem dúvida, uma mulher que superou incontáveis obstáculos para conquistar espaço e receber o devido reconhecimento.
É claro que escrevo este artigo na posição de uma mulher branca que desconhece todas as adversidades que uma mulher negra enfrenta nesse mundo, mas entendo o significado do que ela quis dizer com essa afirmação e percebo que muitas pessoas têm a mesma dificuldade: a de superar aquilo que atrasa, bloqueia e impede de focar nos objetivos e em como conquistá-los.
Dada a proximidade que tive com a comunidade de UX nos últimos anos, lidando com pessoas em diferentes níveis de senioridade, de diversas regiões do país, com objetivos e personalidades diferentes e em momentos diferentes da carreira, pude perceber alguns traços em comum que podem nos ajudar a entender a origem dessa dificuldade. O maior deles, na minha visão, está relacionado ao medo de se expor. O que pode acontecer o tempo inteiro, como: quando precisamos fazer escolhas, quando queremos tentar algo novo ou diferente, quando propomos soluções, questionamos, apresentamos um projeto, ou até mesmo defendendo um ponto de vista.
Em resumo:
Medo de dar as caras.
Brené Brown, professora da Universidade de Houston, há anos realiza pesquisas para entender comportamentos que levam a vergonha e ao sentimento de vulnerabilidade. Muitos de vocês já devem ter assistido sua palestra “O poder da vulnerabilidade”, ela é uma das mais vistas no TED. A Netflix também fez um especial: “A Call to Courage” onde ela discute o que é preciso para trocar o conforto pela coragem em uma cultura definida pela escassez, medo e incerteza. Além de ter escrito diversos livros relacionados ao assunto, em "A coragem de ser imperfeito" ela diz: “É preciso coragem para ser imperfeito. Aceitar e abraçar as nossas fraquezas e amá-las. E deixar de lado a imagem da pessoa que deveríamos ser, para aceitar a pessoa que realmente somos.”
Quando as pessoas sentem um medo excessivo da exposição e do fracasso, é um prejuízo enorme para qualquer empresa ou iniciativa que lide com inovação. Uma solução incrível que habita apenas uma mente solitária, sem ser colocada em prática ou ao menos avaliada, não vale nada. Precisamos entender que o fracasso faz parte da jornada do sucesso e podemos pensar em inúmeros personagens da nossa história que têm muito a nos ensinar sobre isso.
O meu preferido, penso nele sempre que erro uma, duas ou duzentas vezes, é Tomas Edson, que precisou de 25 mil tentativas para conseguir construir uma lâmpada. Ele diz: “Eu aprendi muito mais com os meus erros do que com meus acertos.” e “Eu não fracassei. Apenas descobri 25 mil maneiras que não funcionam.” O que nos leva a entender que errar é natural e que a persistência é um dos fatores-chave para alcançarmos o sucesso.
Walt Disney, que já foi demitido, acusado de preguiçoso, de ser uma pessoa sem imaginação ou criatividade, teve que declarar falência da sua empresa aos 22 anos, além de ter tentado emplacar diversas obras ao longo da sua carreira que não tiveram sucesso algum. No entanto, hoje a companhia faz parte da formação de uma geração e claro, dispensa apresentações. Ele diz: "Aqui, no entanto, nós não olhamos para trás por muito tempo. Nós continuamos seguindo em frente, abrindo novas portas e fazendo coisas novas porque somos curiosos. E a curiosidade continua nos conduzindo por novos caminhos." A história de sucesso da Disney, na verdade, é uma história de muitos fracassos.
Imaginem como seria a nossa realidade se Malala, Michelle Obama, Ruth Bader Ginsburg, Grace Hopper, Jane Austen, Amelia Eahart, Virginia Woolf ou Ada Lovelace tivessem medo de errar, de colocar suas ideias em prática ou se tivessem desistido porque fracassaram algumas vezes?
Para a comunidade, os profissionais que já atingiram certa maturidade, lembre-se que muitas pessoas ainda estão em um processo para superar o medo da exposição e vulnerabilidade, e que provavelmente você já passou por essa fase também. Por isso, um apelo: Sejam agentes encorajadores! O mundo já está cheio de críticos.
Quando ver uma pessoa tentando colocar seus projetos em prática, não seja aquela pessoa que fica sentada, só analisando e falando sobre como você teria feito melhor. É muito fácil assistir de longe e ter sucesso apenas na imaginação, estando fora do contexto. Ao invés disso, faça parte dessa experiência. Ofereça seu talento e pergunte como pode contribuir de uma forma positiva. Eleve as pessoas. A gratidão que recebemos em retorno é uma das sensações mais deliciosas do mundo.
E para você que precisa sentir mais segurança, algumas dicas:
1. Nunca pare de estudar, pesquise muito sobre o assunto que está trabalhando, reúna referências e dados para que as suas ideias estejam cada vez mais embasadas e cercadas de fundamentos. Pesquise o tempo inteiro. É o conhecimento que vai trazer a confiança que você precisa.
2. Caso a sua insegurança tenha origem no fato de que você ainda não decidiu qual caminho seguir, o que é natural já que temos sempre muitas possibilidades, analise outras pessoas e os trabalhos que elas já desenvolveram, principalmente as que você admira, identifique padrões. Analise também iniciativas e projetos que você admira, como surgiram, onde acertaram, onde erraram e como contornaram.
Para te ajudar, lembre-se dessa passagem de Friedrich Nietzsche, filósofo alemão do séc. XIX que realizou muitas críticas à moral de sua época e até hoje ainda é bastante polêmico: "Demore o tempo que for para decidir o que você quer da vida, e depois que decidir não recue ante nenhum pretexto, porque o mundo tentará te dissuadir."
3. Identifique seus bloqueios e o que te impede de realizar seus projetos. Desprenda-se da ilusão de controle, é tudo o que não temos. Desapegue de qualquer sentimento que te cause medo ou tire seu foco. Elimine da sua vida tudo aquilo que te faz mal, incluindo hábitos que não são tão positivos. Vigie seus pensamentos. Coloque tudo de ruim que passar pela sua mente em uma caixinha e solte! Permita-se alçar vôo!
Quando você tem uma ideia e decide colocá-la em prática, você inspira pessoas, e mesmo que no final você perceba que ela não foi a melhor ideia do mundo, você tem a experiência para tentar novamente por meio de outros caminhos.
Um agradecimento especial ao meu amigo Vitor Guerra, pelo convite pelo segundo ano consecutivo, a Vânia Teófilo e a Thaís Haro pelo encorajamento, e a Jana Velozo, que muito carinhosamente me recomendou que escrevesse sobre algo that haunts me. E aqui estamos.
Por mais coragem para aceitarmos nossas vulnerabilidades, para colocarmos projetos em prática e criarmos soluções cada vez mais transformadoras.
Be brave.