Designer de produto nascido em Maceió, passou por São Paulo, Rio de Janeiro, Dublin e mora em São Francisco. Trabalhou na Huge e hoje está na Elephant (agência de design digital) liderando times em diversos projetos para Apple, Beats, Twitch, Cisco e algumas startups.
Algumas vezes nesses últimos anos fiz parte de projetos que fracassaram. Quando falo em fracasso, me refiro a não serem implementados conforme o esperado ou que se desorganizaram e perderam o foco no decorrer do processo, causando inúmeras frustrações dentro do time. E sempre que isso acontece, terminamos perdendo a paixão pelo produto e o único objetivo se torna querer nos livrar daquela "bomba".
"Setting up for success" foi um termo que escutei bastante desde que vim trabalhar em San Francisco e só comecei a entender mais claramente depois que assumi uma posição de liderança nos projetos que participo. Eu acreditava inicialmente que o segredo era só selecionar os melhores designers e não teria como dar errado, sendo que na verdade não é bem assim. Passei a entender que existe uma série de variáveis "invisíveis" mas que normalmente são extremamente importantes para prevenir que nossos projetos naufraguem.
Vou tentar tangibilizar algumas dessas variáveis que venho observando dentro da minha experiência trabalhando em uma agência de design de produtos digitais.
Primeira decisão que considero relevante para o sucesso é a escolha do time, nesse momento tento trabalhar junto com o time administrativo e gerentes de projeto para determinarmos juntos a quantidade de recursos que serão alocados de acordo com o orçamento e a necessidade de cada projeto. Acredito ser necessária a participação de um líder criativo ativamente nessa decisão por conseguirmos ter uma visão melhor dos processos para determinar quais dos designers disponíveis terão o melhores skills.
De forma geral, sempre tento trabalhar com times pequenos. Talvez seja uma preferência pessoal, mas acredito que em times maiores é preciso dedicar mais tempo fazendo alinhamentos internos, além de uma maior probabilidade do time caminhar em direções divergentes. Quanto menor o time mais influência cada indivíduo terá no resultado final, o que dá uma motivação extra e um senso de responsabilidade e propriedade para os designers.
Quando o time é novo, existe também uma curva de aprendizado até a dinâmica começar a se encaixar. Quando o projeto tem deadlines extremamente curtas, tento montar um time que já tenha uma certa fluência trabalhando em conjunto. Como nem sempre essa é uma opção, nesses casos tento ajustar as expectativas e entregas entendendo que isso vai acontecer nas primeiras semanas de trabalho e tá tudo certo.
Acredito que os melhores projetos surgem quando a atmosfera do time está boa e as coisas acontecem de forma mais orgânica, então durante todo o processo me questiono e converso individualmente com cada um para entender se estão felizes com sua contribuição e com o progresso do projeto. Planejar atividades fora do ambiente de trabalho é sempre uma boa prática para o time sair um pouco daquela "bolha técnica" e se conectar. Antes da quarentena saiamos sempre que se fechava um ciclo do projeto para atividades sociais e jogos, mas durante o COVID, devido ao distanciamento social, esse tem sido um desafio ainda maior. Ultimamente temos reservado um tempo para happy hour e jogos online e aparentemente vem dando certo, em especial Among Us tem sido um jogo bem divertido para criar essa conexão.
Esse é o momento em que as principais decisões do projeto são tomadas, sejam elas internamente ou junto ao cliente. Em parceria com gerente de projeto e líderes de outras disciplinas envolvidas (time de produto, desenvolvimento, relacionamento com o cliente) tento determinar a melhor cadência de reuniões para cada projeto.
Reuniões internas são mais fáceis de administrarmos já que temos mais controle da situação. Obviamente a quantidade e necessidade de reuniões varia de acordo com a dinâmica de cada projeto, mas tento garantir que o time de design tenha pelo menos um momento junto diariamente (sem gerente de projetos ou terceiros) para evitar causar qualquer tensão e focarmos apenas em discutirmos nossas explorações.
Quanto mais novo é o time, mais frequente são essas reuniões para que possamos ter certeza de que estamos alinhados nos problemas e oportunidades que estamos explorando. Antes da quarentena, gostava muito de casualmente nos reunirmos na tela de um ou outro para trocarmos ideias, mas neste momento tento deixar os horários reservados e ferramentas como o Figma, Slack e outras tem facilitado bastante a colaboração remota.
Como o time do projeto não é composto apenas por designers, tentamos nos conectar pelo menos uma vez por semana com outras disciplinas (estratégia, redação, produto, desenvolvimento, etc.). Normalmente eu prefiro adicionar mais check-ins (mesmo que mais curtos) de que incluir múltiplas áreas na mesma reunião, dessa forma cada reunião tem uma agenda e objetivo muito mais claro e evita feedback em diferentes frentes, que muitas vezes podem ser contraditórios e deixar o time perdido.
Para exemplificar aqui como fica o resultado dessa equação, uma cadência muito comum é:
De forma geral, eu acredito que o cliente é um grande colaborador do projeto e existem dois grandes pontos de aprendizados para time de design durante essas interações. Um deles é que, apesar de muitas vezes sermos potenciais usuários dos produtos que estamos desenvolvendo, o cliente tem um entendimento do negócio muito melhor que a gente que está emergindo naquela indústria há muito pouco tempo. O segundo ponto é que é fundamental entendermos os recursos e a logística que eles terão disponíveis para poder administrar o produto que estamos desenvolvendo. Para exemplificar, não adianta entregar um blog se eles não têm recursos ou não é uma prioridade do negócio contratar alguém para gerar e/ou gerenciar o conteúdo.
Normalmente cada empresa que trabalhamos possui uma cultura e dinâmica de trabalho individual onde não temos muita autonomia, mas uma coisa que tentamos determinar é quais são os stakeholders que serão responsáveis pela aprovação das etapas do projeto. O melhor dos mundos é quando o cliente que estamos nos comunicando no dia a dia é o tomador de decisão, mas é muito frequente que, uma vez que o projeto seja aprovado por esse cliente, ainda haja a necessidade de passar pela aprovação do "big boss", que nem sempre compartilha da mesma opinião que ele.
Entender a dinâmica externa é importante também para ajustar nosso processo interno e antecipar fatores que possam influenciar atrasos ou reajustes na timeline do projeto. É muito comum o cliente não ter uma visibilidade clara desse processo e não está preparado corretamente, atrasando para providenciar feedback ou outros erros comuns que retardam todo o processo. Nesses casos, me comunico e confio no time de relacionamento com o cliente pra fazer esse papel. Participei de projetos que atribuo a maior parte do sucesso ao time de relacionamento, por conseguir ter uma boa leitura da dinâmica do cliente e trabalhar em conjunto para organizar o time deles também para um processo de revisões que se encaixam de forma fluida com nosso processo.
Um outro fator muitas vezes esquecido, dependendo da natureza do projeto, é que precisamos incluir em algum momento do processo uma revisão com outros times do lado do cliente (Acessibilidade, Jurídico, Privacidade, etc.). Já participei de projeto que foi um "sucesso" até ser barrado por questões de privacidade, e outros que atrasaram porque o conceito foi concebido com base em assets que não poderiam ser utilizados por questões legais.
Implementação é um assunto que merece um artigo todo dedicado, mas vou tentar resumir algumas boas práticas que vêm dado certo comigo.
Para que o projeto seja implementado conforme esperado, é necessário que esse assunto seja discutido em vários momentos do processo. Os maiores erros que presenciei foram quando o time criativo trabalhou de forma muito isolada e só incluiu o time de desenvolvimento em uma etapa mais avançada. Nesses casos, se houver qualquer surpresa, os desenvolvedores vão ter que "forçar a barra" para o conceito ganhar vida ou o time criativo terá que adaptar o design de última hora para tornar o projeto viável. Ambas as experiências tendem a minimizar a qualidade do resultado ou, em casos mais extremos, podem impossibilitar a implementação e o projeto nunca ir ao ar.
Apesar de todo projeto terem suas individualidades, tentamos envolver o time de desenvolvimento e de produto cedo no processo. Nos reunimos com frequência para termos certeza que estamos endereçando corretamente os requerimentos necessários, e que as soluções que estamos trazendo sejam implementáveis dentro do contexto de linguagem, plataforma e tempo que os desenvolvedores terão disponíveis.
Uma importante prática que pode ajudar a minimizar um possível design não realista é a inclusão de pelo menos um designer do time com um bom entendimento de desenvolvimento. Tento também evangelizar a prática de protótipos nos times que participo para validar explorações, principalmente pra testar conceitos ou funcionalidades mais complexas, e também para que possam servir como referência para o time de desenvolvimento, de modo a fornecer uma direção mais real e detalhes dos designs concebidos que só as telas estáticas não comunicam (interações, bezier, velocidade, ordem na transição de elementos, etc.).
Finalmente, a última fase de um projeto é a passagem de bastão do time de design para o desenvolvimento. Já vi muitas entregas rasas onde o time de design deixou muitas dúvidas e decisões para serem tomadas pelos desenvolvedores, e outras entregas onde o time terminou perdendo tempo documentando especificações repetidas ou desnecessárias. Costumo fazer um checklist dos itens que deverão conter no arquivo final junto ao líder do time de desenvolvimento para evitar surpresas e estimar quanto tempo será necessário para produção dos arquivos finais. Sempre que surge uma dúvida sobre a necessidade de uma coisa ou outra, esclarecemos nos nossos check-ins semanais.
Todas essas experiências compartilhadas são específicas do meu dia dia, e espero que possam de alguma forma contribuir com seu contexto.
No final das contas, mais importante do que seguir cada tópico à risca, é continuarmos questionando, antecipando e adaptando todas essas variáveis que não fazem parte necessariamente dos aspectos técnicos de um projeto, mas que tem uma influência direta no sucesso dele, e na felicidade da equipe.