Carioca da gema! Graduada em jornalismo, design e pós graduada em docência. Passei por empresas como IBM, Elo e Banco BV. Criadora do canal/evento/podcast Clube do UX. Professora nas horas vagas Sou especialmente interessada em estratégias de negócios e suas relações com UX.
Eu fui uma criança que cresceu com a ideia de que quando eu me tornasse uma adulta estaria nos confins de algum país pobre salvando pessoas da fome e miséria. Isso é muita responsabilidade pra uma pessoa só, né? Tenho certeza que muitos de vocês estão lendo esse texto agora mesmo e lembrando da infância onde você tinha certeza que se tornaria algum super herói ou salvador. Acho isso tudo inclinações muito nobres, mas infelizmente a realidade sempre atropela a gente e derruba nosso castelinho de sonhos, mostrando que não só essa não é uma missão de uma pessoa só como também é um fardo muito pesado. Parece que até hoje, na idade adulta, muitos ainda perpetuam a síndrome de super-homem (isso existe?). Queremos levar a salvação pra todos, de preferência usando o que fazemos de melhor.
Nossa, Bruna! Quanto pessimismo e o texto mal começou...
Calma! Até o final desse texto eu espero que você entenda essa crise de Schopenhauer que assolou esse primeiro parágrafo.
De acordo com a economista Talita Carvalho, a definição de capitalismo é:
O capitalismo é um sistema econômico que visa ao lucro e à acumulação das riquezas (...) Há duas classes sociais principais nesse sistema: os capitalistas (ou burgueses) e os proletários (ou trabalhadores). Os capitalistas são os donos dos meios de produção, eles empregam os trabalhadores e a eles pagam salários. Os proletários, oferecem sua mão-de-obra para realizar determinado trabalho em troca de uma remuneração - Talita de Carvalho/Politize.com.br, 2018
Ou seja, nós, a classe trabalhadora produzimos para que a burguesia aumente suas riquezas, mas isso a gente já sabia né?
Bruna, você tá muito comunistinha
Só estou atentando os fatos! Prometo.
Segundo o incrível escritor Rafael Cardoso:
O design é fruto de três grandes processos históricos que ocorreram de modo interligado e concomitante, em escala mundial, entre os séculos 19 e 20.
O primeiro destes é a industrialização: a reorganização da fabricação e distribuição de bens para abranger um leque cada vez maior e mais diversificado de produtos. - Cardoso, Rafael, 2016, p. 22
Isso quer dizer que o design está envolvido até o pescoço com a industrialização européia, sim tô falando da revolução industrial, lá nos meados do século 19. Percebe que o autor diz que o objetivo é um leque mais diversificado de produtos? Sabe a Disney que era produtora de filme, virou parque, canal a cabo, marca de roupas, streaming de vídeo e por ai vai? Isso é diversificação de produtos numa mesma marca e podemos comparar isso ao que o Rafael fala lá no livro. No final das contas estamos falando em gerar mais capital.
Lembra que lá em cima eu falei do complexo de super-homem? É nesse ponto que quero chegar. Ainda parece muito nebuloso falar do mercado como um motor de geração de renda. Parece que precisamos ter certeza que existe um propósito pra tudo isso, afinal, não é possível que a gente só vive pra pagar boleto.
Acho imprescindível colocar esse tema na mesa e mostrar que na maior parte das vezes é só isso mesmo. Somos a classe que produz a riqueza que vai ser usufruída por outros que não somos nós e é assim mesmo, sem rodeios e sem romantização do mercado privado.
Pra uma empresa existir ela precisa de geração de lucro, a não ser que estejamos falando do terceiro setor, ou seja, instituições sem fins lucrativos. Se hoje mesmo você decidisse abrir sua empresa design bem lindona, como ela vai ser manter funcionando se o dinheiro não entra e mantém suas contas no verde?
Deve!
Existe uma história maravilhosa que li sobre um designer que desenvolveu um artefato que ajuda pessoas com pouca mobilidade nas mãos a voltar a usar o membro com mais autonomia e melhor. Ele não cobra nada pelo produto e quer manter assim pra sempre, mas é claro que ele tem um outro emprego que o mantém o possibilita essa boa ação.
Eu sou daquelas pessoas que trabalha, dou o meu melhor, recebo o meu salário e com ele faço o que acho mais verdadeiro pra mim. Ajudo as pessoas da forma que me convém e é claro, gasto com uma cervejinha no fim de semana. Não me julguem. Eu preciso do dinheiro pra fazer a transformação que eu acho cabível e tenho noção de que, de novo, não vou salvar o mundo.
Quando eu trago todo esse contexto pra você, o que eu realmente quero é te dizer pra tomar muito cuidado e não se frustrar quando você perceber que não tá salvando a vida de ninguém fazendo design no dia-a-da (sentiu a referência ao Norman?). Que muitas das vezes vamos fazer um produto incrível que vai ajudar inúmeras pessoas, mas que é possível que não seja levado ao mercado ou não perdure por falta de lucro. Que vamos fazer coisas, muitas das vezes, às pressas e sem as fases do projeto que desejamos e entendemos que é certo pois a gerência tem pressa em fechar o orçamento.
Esse não é um texto de pessimismo, mas sim uma mensagem que eu deixo pra você não carregar o mundo nas costas (Alô Atlas!) e achar que você é o único frustrado nesse planeta. Enquanto a gente vive nesse modelo de exploração da mão de obra, somos a geração que busca o propósito para viver. Não queremos mais ser como nossos pais e avós, temos que ter fazer valer a pena. A junção desses dois fatores não combina, é tipo água e óleo e resulta em, cada vez mais, pessoas esgotadas mentalmente.
Esse é um texto opinativo que carrega a minha vivência de anos (tô velha) no mercado de trabalho privado. Se você tem uma opinião diferente, eu encorajo você a escrever e dividir com o mundo e comigo. Precisamos de mais pensamento plural.